sábado, 26 de janeiro de 2013

A TIA

Quase todo mundo tem pelo menos uma tia. Eu tenho a minha. Dulce e Rosangela tambem tem uma. Cada uma com suas particulariedades. Algumas com histórias de vida plenas de sucessos;outra que viaja sempre para Paris e nos tráz sempre como lembrancinha uma miniatura da Torre Eiffel (tão bom se ela trouxesse pelo menos um Chanel nº 5); outras, não tão sortudas, fizeram um casamento ruim, arranjaram um monte de filhos, foram abandonadas e tiveram que agarrar a vida com as mãos nuas e tocar para a frente. A tia das minhas amigas é assim. Sem muita instrução formal, casou, teve cinco filhos, o marido nunca foi bom nem para ela, nem para os filhos, acabaram por se separar. O miserável não ajudava com um mísero centavo e não restou outra opção para tia: vamos à faxina.
Foi assim que ela foi parar na casa de Dulce, onde os laços se estreitaram e ela agora, já com os filhos crescidos tornou-se uma segunda filha para minha amiga. Não é só a "faxineira" (trabalho bem digno, por sinal). Acompanha a família em passeios, é parceira de todas as horas. É uma mulher de corpo grande, simples, mas dona de uma delicadeza, de um jeito tranquilo, de uma capacidade de enfrentar os revezes da vida sem se tornar amarga ou revoltada. Não há muito tempo, travou uma batalha contra um câncer e sua força de vontade de continuar viva foi fator primordial para remissão de sua doença. Infelizmente tem o dedo podre para escolher maridos. O segundo valia menos que um palito de fósforo queimado. Chegado a uma "caninha", violento, uma amante atrás da outra.
E a tia calada, muda que nem parede, só vendo e ouvindo. Até uma noite em que ela resolveu dar um basta, mas ao jeito dela. Esperou o sujeito chegar da gandaia durante toda a noite. Ele ainda teve a cara de pau de trazer junto consigo, além do bafo da bebida, uma "amiga". Tia nada disse, só pediu que a "dona" fosse embora. Sozinha com ele, colocou-o na cama, deixou-o dormir e aguardou que o porre passasse. Esperou pacientemente por horas, afinal uma bebedeira custa a passar. Quando o canalha finalmente acordou, ainda sob o efeito da ressaca, ela avisou: "agora, que você acordou, você vai apanhar". E ela bateu, deu-lhe uma surra de criar bicho. Deixou-o estirado no chão, já com a malinha pronta para que ele sumisse de suas vistas.
Feito isso, muito calmamente, se arrumou e foi à delegacia. Lá contou à delegada o que tinha feito e ainda deu a explicação final: "doutora, deixei o porre passar para depois surrar, porque não se bate em bêbado". Nunca mais teve notícias dele, que não era bobo nem nada para levar outra camaçada de pau. Recentemente perdeu seu filho mais moço, num acidente de caminhão. Garoto jovem (24 anos). Nem vou me ater aqui sobre a sua dor, pois esse sofrimento é indescritível. Mas pensam que ela se revoltou, se colocou contra Deus, questionou o porquê de tantas desgraças? Aceitou, faz parte da vida, cada um com seu fardo e o dela é bem grande, mas suas costas são largas e ela o leva, pois se deixá-lo no chão ninguém vai recolhê-lo e levar para ela. Grande tia Araci. Tenho a felicidade de conhecê-la, faz a gente ver a vida sob outro foco.

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